terça-feira, 14 de julho de 2009

Conselhos grátis: porque se vender, ninguém compra.

O pessoal às vezes me escreve perguntando coisas a respeito da vida de escritora.
Bem.
Não sei nada a respeito da vida de escritora.
Mas da vida de aspirante a escritora sou Doutora com dê maiúsculo.
Por isso resolvi compartilhar com vocês um pouco do que eu aprendi até agora.
Porque pulando etapas e evitando erros, chegamos antes.
E em melhores condições, psicologicamente falando.

Primeiro: escrever é reescrever.
Não adianta sentar na frente do computador, digitar frenética e aleatoriamente um monte de pensamentos e záz: você é um escritor.
Escrever é um trabalho como qualquer outro, e se você não dedicar tempo e atenção, suor e transpiração, seu texto não passará de um amontoado de frases que qualquer pessoa alfabetizada é capaz de colocar no papel.
Portanto, se quiser escrever coisas para que outras pessoas leiam (e gostem), por favor: corrijam os erros de digitação, de português, os espaçamentos, a concordância.
Alguns desacertos passarão, ninguém aqui é perfeito, afinal.
Mas saiba que alguns erros (ou um caminhão deles) são imperdoáveis.

Segundo: não fique neurótico achando que vão plagiar seus textos.
Porque ninguém vai fazer isso.
Porque antes de plagiar o seu texto, vão plagiar o texto do Luís Fernando Veríssimo, meu caro.
Mais: SE plagiarem, e daí?
O texto é seu, saiu da sua cabeça, e de onde ele veio certamente existem muitos outros.
O plagiador é quem vai fazer papel de bobo, porque a fonte é e sempre será a fonte.

Terceiro: crie um blogue.
Não existe jeito melhor de divulgar seus escritos do que em um blogue.
Esqueça essa bobagem que estão tentando colocar na sua cabeça, de que blogue não vale a pena, que desmerece a literatura, que é perda de tempo.
O que não vale a pena, desmerece sua literatura e é perda de tempo é ficar com todos os teus escritos engavetados, esperando que algum bambambam editorial lhe diga olá.

Quarto: já tem os originais prontos do seu livro de estréia e está se preparando para assinar um contrato com a Editora Globo?
Esqueça bêibe.
A não ser que você seja filho do Dias Gomes, isso não vai acontecer.
As editoras grandes e médias (e, acredite, as pequenas também) estão pouco ligando para você e seu livro e o que sua mãe pensa sobre isso.
Não importa se você tem talento; importa se você vende.
Portanto, saiba que sua primeira publicação não vai ser um mar de rosas, com confetes caindo na sua cabeça e aplausos efusivos de fãs entusiasmados.
Se conseguir publicar sem precisar pagar, já se dê por muitíssimo satisfeito.
Ah, sim, muito importante!
Saiba desde já que você vai sim precisar vender os seus livros.
Lembre-se que você não é conhecido e ninguém vai se estapear nas livrarias para levar o último exemplar da sua obra.
Portanto: mexa-se.

Quinto: Divulgue-se.
Sim.
Autopromoção descarada, porque se você não fizer, ninguém terá a gentileza de fazer.
Use a internet a seu favor.
Use tudo que puder a seu favor.
É bobagem ficar sentado, choramingando as mazelas e dificuldades e injustiças do mercado editorial e do leitor brasileiro.
Nada vai mudar só porque você está chateado.
Então é melhor que aprenda a dançar ao ritmo da música que está tocando.
Não só em sua carreira de aspirante a escritor, mas em tudo nessa vida: os espertos se adaptam, os preguiçosos se acomodam e os idiotas reclamam.

Sexto: Dê um passo de cada vez, rapá!
Não é porque você escreveu um texto hoje que amanhã ele vai estar publicado em um veículo de grande circulação.
Os meios de comunicação, tal e qual as editoras, também estão se lixando para quem não vende e, lembre-se sempre: você não é o Luis Fernando Veríssimo.
Pelo menos ainda.
E digo mais: quanto mais você escrever, melhor irá escrever, então dê tempo ao tempo.
Lapide sua escrita.
Refine-a.
É sempre mais fácil para quem sabe escrever.

Sétimo: do mesmo jeito que um motorista não dirige somente um modelo de veículo, um escritor não pode escrever apenas um tipo de texto.
É óbvio que você vai se sair melhor em alguma modalidade, mas quem escreve, escreve poesia, conto, crônica, prosa, bula de remédio, obituário de jornal, receita de bolo.
Uso até um exemplo (meu, é claro) para melhor ilustrar a questão: como alguns de vocês já sabem, estou organizando uma antologia de contos policiais brasileiros chamada Assassinos S/A, pelo selo Anthology, da Editora Multifoco. Muita gente me escreve dizendo que gostaria de participar, no entanto não escrevem contos policiais.
Ora, como assim?
Você pode não estar habituado a escrever contos policiais, mas se quiser, escreve.
E é mais bacana ainda, porque funciona como um desafio à sua própria capacidade de criação.
Outra: tamanho também não é documento em se tratando de literatura.
Por estes dias, tive acesso ao Desafio Literário do curso de Formação de Escritores e Agentes Literários da Unisinos, onde qualquer pessoa, independente de ser aluno da universidade, pode enviar um conto para publicação no site.
Lendo as regras de participação, descobri que o texto não poderia ter mais que 200 caracteres.
Com espaço
- Peraí – pensei – 200 caracteres são duas linhas!
Então fui ler o que Fabrício Carpinejar, mentor da idéia, tinha a dizer para tentar me convencer a contar uma história em tão limitado espaço.
Ele disse:

“O exercício é inspirado em iniciativas como ‘Os cem menores contos brasileiros do século’ (Ateliê Editorial), antologia organizada por Marcelino Freire.
Para quem pensa que é impossível ser tão conciso, basta pensar no mais famoso microconto do mundo, de Augusto Monterroso, com apenas 37 letras: ‘Quando acordou, o dinossauro ainda estava lá’.
Literatura para nocaute: jab, hook, gancho, cruzado, direto. Sucessão de golpes para o leitor ver estrelas mais cedo.Brevidade é intensidade. Dizer pouco, mas dizer bem. As narrativas microscópicas (...) exigem poder de síntese e de imaginação, a partir de um pequeno conflito ou uma contradição. Cabe, portanto, sugerir mais do que expor, captar um detalhe e uma semelhança até então irrelevantes”.

Em outras palavras: quem escreve, escreve poesia, conto, crônica, prosa, bula de remédio, obituário de jornal, receita de bolo.
Com 30 ou 500 mil caracteres.

Oitavo: Se você não tem tempo para se dedicar a escrever (desculpa que muito ouço), então não tenha a pretensão de ser escritor.
Se as pessoas que correm atrás, e se dedicam, e se arrebentam, às vezes não conseguem, que dirá quem não faz nada porque “está muito cansado”.
Pois, ou você quer de verdade, ou então você não quer.
E por último, mas nem por isso menos importante: não fique desesperado depois do primeiro não.
Acredite, será o primeiro, de muitos.
Também não adianta fazer essa cara de cachorrinho que caiu do caminhão de mudanças, decepcionado e tristonho porque, até então, você tinha certeza que iria publicar numa tiragem de 3 mil exemplares, vendê-las em meia hora e ficar rico.
Não é fácil nem rápido alcançar reconhecimento, seja como escritor, seja como jardineiro, psicólogo, policial federal, dono de padaria.
A vida é dura, e chega antes quem sai na frente.
A frase pareceu óbvia?
E é.
Mesmo assim vale ser repetida.
Parafraseando Afobório: enquanto você dorme, tem gente que está acordada.
Ficadica.